RotaWeeb: Um breve tour pela KyoAni

Marcelo Hagemann Dos Santos
30 min readJul 25, 2019

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Como já mencionei no começo do meu primeiro texto dessa série, a RotaWeeb não tem como objetivo a nostalgia ou a mera revisitação do passado, mas sim a criação de uma ponte entre ele e o presente. A minha pretensão com esses textos é permitir a quem se dá o trabalho de ler os meus textos se aproximar de quem os escreve, entender minhas origens como assistidor de animes e de onde vêm o meu gosto e interesse por essa mídia.

Inicialmente eu não tinha a pretensão de dar seguimento para essa série tão cedo, pois escrever sobre mim mesmo, revisitar minhas memórias longínquas e colocá-las em um papel é algo bastante complicado e requer um planejamento estranho, para dizer o mínimo.

Mas considerando os eventos recentes, o tamanho do incêndio criminoso que atingiu um dos prédios da Kyoto Animation, e o fato de que o estúdio é um dos (se não o) mais importantes em minha trajetória como fã de animação japonesa, nada mais junto que eu preste minhas homenagens às vítimas desse atentado tão odioso da forma que posso: Revisitando minha relação com o estúdio, e, mais especificamente, com as obras que eles produziram.

Sobre a tragédia em si, fiquei sabendo do crime quando ele recém tinha acontecido. Estava em chat de voz do discord na noite de quarta para quinta-feira quando as primeiras informações começaram a vir à tona. Mesmo nesse primeiro momento já estava bastante claro de que não se tratava de um incêndio acidental, mas sim proposital. Entretanto, não fazíamos ideia das motivações por trás do ataque, e muito menos do tamanho do massacre que ele provocara.

Conforme fomos adentrando na madrugada as informações a respeito do tamanho do incêndio passaram a ser mais claras, e ficou bastante evidente de que o número de casualidades seria bem maior do que eu gostaria, ou seja, mais que zero.

Por outro lado, as motivações do assassino (porque é isso o que ele é) ainda não estavam oficializadas, mas muito se especulava a respeito delas. Uns diziam que se tratava de um fã não muito satisfeito com os rumos que um das obras do estúdio havia tomado, outros diziam que pudesse ser um ex-funcionário do estúdio que tivesse algum rancor pessoal com a empresa ou mesmo com algum dos trabalhadores dela.

Mas desde então já havia o rumor de que o autor do crime acusava o estúdio de ter plagiado uma de suas obras através de um site japonês similar ao 4chan, mais especificamente uma música de sua composição, uma acusação da qual outros frequentadores do fórum não concordavam. Apenas na manhã de sexta-feira que fora confirmado de que o autor do crime de fato acusa a empresa de tê-lo plagiado, apesar de não confirmarem exatamente em quê.

De qualquer forma, ainda que fosse verdadeira a acusação de plágio, isto não justificaria tal massacre, até porque absolutamente nada justifica um ato tão extremo desses. E, ainda, isso nem mesmo justificaria qualquer forma de violência física contra o estúdio. Já que não é atacando alguém que muito provavelmente não tem nada haver com o caso vai resolver alguma coisa.

Ainda naquela madrugada de quinta-feira já sabia a tristeza bateria apenas na manhã seguinte, quando a ficha caísse. Até o momento tudo parecia tão distante, tão surreal, como se fosse uma notícia inventada por alguém. Mas sabia que esse sentimento iria passar, que uma hora processaria a informação e as emoções viriam todas de uma vez.

Foi assim com a morte de ambos os meus avós, com a morte de meu tio, e até mesmo quando anunciaram a morte do ex-CEO da Nintendo, Satoru Iwata. E com o incêndio da KyoAni não foi diferente. Bastou ler uma pequena lista com quatro nomes, a três deles confirmados como seguros, para que as lágrimas finalmente escorressem de seus olhos e alguns soluços engasgarem minha garganta. Não sei dizer ao certo se fora um choro de alívio pelos nomes que estavam lá, ou angústia por pensar naqueles que não estavam, mas uma coisa era certa: o tamanho do buraco que essa tragédia deixaria.

O que esperar da KyoAni

KyoAni sempre foi um estúdio excepcional dentre todos os estúdios de animação japonesa, cuja filosofia valoriza a qualidade no lugar da quantidade, o que fica bastante evidente ao olhar as suas obras e seu histórico como produtora. Não apenas ela é responsável pelas cenas das mais belas e bem detalhadas de toda a história mundial da animação, como ela é uma das poucas empresas do ramo que opera utilizando um quadro de funcionário próprio, com desenhistas, diretores e ilustradores contratados integralmente, em vez de contratarem animadores Freelancers para concluírem os seus projetos.

Por conta disso, a KyoAni é uma dessas empresas que nem sempre está presente em cada nova temporada de animes, em contraste com outros estúdios que volta e meia possuem três ou mais títulos sendo exibidos nos mesmos três meses. Em contrapartida, cada anuncio, cada estreia, cada novo anime, ou cada continuação, é motivo justo para todas as formas de hype possíveis.

Afinal, anime da KyoAni sempre foi, e torcemos para que sempre seja, sinônimo de um trabalho cuidadoso, apaixonado, e recheado das mais variadas emoções que podemos ter em uma narrativa, não apenas pelo cuidado que o estúdio tem pelo visual de suas obras, mas também pelo conteúdo delas.

Se você é alguém que até o momento nunca se importou com estúdio, com que casas são responsáveis por quais trabalhos, ou se você apenas quer assistir algo que te toque de alguma maneira, eu recomendo de coração que você assista os animes da KyoAni, porque eu tenho certeza que ao menos um deles vai te tocar profundamente, se você assim deixar.

Começando por Air, tenho que ser sincero em dizer que não sei direito se o assisti antes ou depois de Clannad, é mais provável que Clannad tenha sido o meu primeiro anime da KyoAni quando comecei a assistir outros animes fora aqueles que passavam na televisão aberta ou fechada, mas como os assisti mais ou menos da mesma época (provavelmente até mesmo na mesma semana), decidi começar por Air, por ser o mais antigo.

E o que dizer sobre Air? Bom, há muitas coisas que eu poderia dizer sobre esse anime, a primeira delas é que ele faz parte das três séries da produtora de Visual Novels chamada Key que foram adaptadas em anime pela KyoAni. Depois delas vieram outras adaptações, mas todas por outros estúdios. Inclusive, é um desejo relativamente comum ser expresso em fóruns e outros espaços de discussão na internet é a vontade de ver mais uma obra da Key ser adaptada pela KyoAni porque, bom, ela fez um ótimo trabalho nessas três adaptações.

Essas três adaptações da KyoAni possuem algo em comum, ambas dividem uma estrutura narrativa bastante comum nos anos 2000s, em que o protagonista de um harem, conforme vai conhecendo suas pretendentes, vai lidando também com os seus problemas pessoais, e as ajudando a superá-los.

Air em particular é o anime que me ensinou que segurar o choro, as lágrimas, e tentar esconder as demonstrações fisiológicas do seu corpo de tristeza apenas as tornam mais fortes, porque oh boy como esse anime me fez chorar.

Do início ao fim, a cada arco, a cada novo episódio que vai mais fundo nas relações das protagonistas consigo mesmas e com aqueles que as rodeiam, o narrativa vai aos poucos abalando as suas estruturas até que o seu emocional esteja tão fragilizado que as lágrimas e os soluços vem e você já nem entende porque disso.

Se a sua intenção é a de limpar os olhos com a água que vem do corpo sem ter que descascar cebola, ou simplesmente deseja experimentar o efeito catástico que duas horas bem choradas pode fazer em seu corpo, Air é definitivamente uma boa pedida, e merecedor de um espaço em destaque em qualquer lista de animes mais tristes de todos os tempos.

Clannad foi a última adaptação das VNs da Key feita pela KyoAni, e por longos anos foi o meu anime favorito, tanto é que o reassisti ao menos três vezes, o que é bem atípico para minha pessoa.

Clannad também é muito provavelmente um dos responsáveis por ter despertado em mim um interesse mais profundo por animes de romance, principalmente aqueles que possibilitam mais de um pareamento possível entre os protagonistas.

Muitas pessoas consideram Clannad After Story como uma história a parte, mais independente da primeira temporada, e eu entendo perfeitamente essa linha de pensamento, afinal o sentimento que há em torno das duas temporadas são, relativamente, bem diferentes entre si.

Enquanto a narrativa da primeira temporada é mais leve, focada no cotidiano colegial dos personagens, a segunda temporada é mais pesada e trata de mais temas voltados a vida adulta, além de impactar mais pessoas do que a primeira temporada.

Porém, eu discordo um pouco dessa linha de pensamento, porque, embora o clima seja diferente entre uma temporada e outra, o que realmente torna a segunda parte de Clannad tão impactante é justamente o fato de já conhecermos bem os personagens envolvidos na trama e termos nos apegado a eles no decorrer da primeira temporada. Além de muitos pontos desenvolvidos na segunda parte derem sido apresentados já na primeira.

Nos emocionamos com a trajetória de Tomoya na segunda temporada justamente porque entendemos ele como personagem até então, o que permite ao telespectador se colocar com maior facilidade em seu papel e sentir com ainda maior peso as emoções do personagem.

Colocando isso de lado, Clannad é um dos poucos animes que tentei assistir junto de minha irmã, que não é nem um pouco interessada em animes. Mas considerando que ela chorou na cena que eu pensei que ela iria chorar, podemos dizer que essa tentativa foi bem sucedida.

Kanon foi o terceiro anime da KyoAni com qual tive contado, o último das adaptações da Key e dos três é menos popular. Mas isso não significa que ele deve ser ignorado, pelo contrário, muitos dos elementos que são interessantes na primeira temporada de Clannad ou mesmo em Air estão misturados em Kanon de uma ou de outra maneira.

Além disso, Kanon foi inicialmente adaptado pela Toei em 2002, mas por qualquer que seja o motivo caiu nas mãos da KyoAni, o que foi uma verdadeira benção porque não apenas a KyoAni conseguiu explorar muito mais a fundo o universo de Kanon, refazendo toda a história em 26 episódios, com essa adaptação, ela é provavelmente a razão para que as adaptações de Clannad e Air viessem a existir.

E apesar da história de Kanon não ser tão intensa quando a dos dois outros animes ele é o que possui a melhor variedade de personagens, o que instiga mais o telespectador a conhecer mais a fundo cada uma das heroínas e possíveis pares para o protagonista. E certamente não é uma história para ser deixada de lado por quem é fã do estúdio ou mesmo se interessa pelas histórias criadas pela Key.

Suzumiya Haruhi no Yuuutsu é para mim uma verdadeira virada no modo em como enxergo animes de modo geral, pois Suzumiya foi o primeiro a me mostrar que animes poderia ser capaz de ser tão literários quanto qualquer outra mídia lá fora. Que eles podiam ser muito mais do que mero escapismo, entretenimento, contação de histórias, boas cenas de luta ou personagens cativantes.

Não que assistir animes para escapar da realidade, passar o tempo, ou por mera diversão seja objetivamente uma maneira ruim ou errada de se consumir a mídia. Pois bem, faço isso até hoje. Mas não há dúvidas de que querer resumir todo e qualquer anime a entretenimento seja de fato um erro.

Suzumiya é importante pra mim porque até o momento era assim que eu assistia animes, como uma forma de passar o tempo, um momento em que eu podia simplesmente esquecer das preocupações da escola, dos falsos amigos e me conectar a novos mundos. E somente dessa forma.

Ele foi o primeiro anime que verdadeiramente me tirou da minha zona de conforto porque pela primeira vez vi muitas das coisas que eu sentia sendo desenvolvidas pela trama através de seus personagens.

Além foi em Suzumiya a obra em que a KyoAni começou a mostrar o seu verdadeiro potencial como estúdio e criar uma identidade visual própria. Não apenas refinando o visual de suas animações como mostrando que o estúdio está disposto a não cortar caminhos para entregar os seus produtos em sua melhor forma para seus consumidores.

Eu ainda não acompanhava animes na época em que a segunda temporada foi inicialmente exibida da mesma forma que acompanho hoje, mas, por mais que o infame arco endless eight seja bastante repetitivo dada a sua… repetição, a KyoAni claramente poderia não ter dedicado tantos episódios ao arco, ou mesmo repetido muito das animações entre os episódios, mas não, cada episódio, cada cena, cada kimono que a Haruhi usa é diferente do episódio e anterior.

E se o arco é agoniante por ser extremamente repetitivo, bom, esse é o exato ponto daquele arco. Por mais que a série seja contada sobre a perspectiva do Kyon, nós, como telespectadores, somos postos no lugar da Nagato que é obrigada a viver aquele mesmo dia, dia após dia, sem ser capaz de desfazer aquele loop por conta própria, e ter que esperar pacientemente que Kyon o faça.

Quando eu finalmente assisti Lucky Star eu já estava completamente inteirado a cultura otaka/weeb, e por isso o anime não poderia ter feito mais sentido quando o vi pela primeira vez.

Foi um relacionamento que começou lento, pois no começo eu não havia entendido exatamente qual era a de Lucky Star, mas rapidamente se tornou algo mais profundo conforme a personalidade de cada uma das personagens e o tipo de humor que a série tentava construir.

Se Clannad e Kanon foram alguns dos responsáveis pelo meu gosto por romances harém hoje em dia, Lucky Star foi o início de uma grande jornada através de inúmeros animes slice of live, ou mesmo animes moe, que assisti em seguida. Muito provavelmente nunca conheceria uma boa parte de meus animes favoritos se não fosse por Konata, Kagami, Tsubasa, Miyuki e suas amigas.

Mesmo hoje em dia, com animes sobre otakus e a cultura otaka em si sendo algo relativamente comum a cada ano, Lucky Star é ainda aquele que melhor entende os próprios amantes da mídia e o que mais conversa com os seus telespectadores. Sem hiper-glamorizar a mídia, ou ofender aqueles que a amam.

E por isso não é atoa que a Konata junto da própria Haruhi, que por sinal são interpretadas ambas pela mesma dubladora, foram até a maior parte dos anos 2010s o maior ícone usado para representar nós como comunidade. Não era incomum ver páginas, blogs ou mesmo canais no YouTube usarem alguma imagem da protagonista como uma forma de expressar a otakisse de seu dono.

K-on foi marcante para mim por diversos motivos. Não apenas ele faz parte da pequena lista de animes que tentei assistir junto de minha irmã, como foi o meu anime favorito por muito tempo, o anime que mais reassisti em minha vida, e um dos animes que marcaram a época em que comecei a de fato acompanhar animes junto das temporadas.

E apenas dizer isso não faria justiça ao quão importante K-on foi para mim naquela época. Não apenas ele foi a gota d’água que eu precisava para comprar uma guitarra e estudar um mínimo de música (ainda que essa ideia não tenha seguido em frente por questões pessoais), como, durante a transmissão da segunda temporada eu assistia cada episódio três vezes, a primeira sem legenda, assim que o episódio ficada disponível, a segunda já legendado, também assim que a legenda ficasse disponível, e por último em full HD, conectando o notebook à televisão da sala.

Isso porque na época estava estudando filosofia fora da minha cidade natal, e por conta disso eu vivia em uma kitnet perto da faculdade, sozinho, sem ter uma televisão onde pudesse tirar todo o proveito da qualidade de imagem que já tínhamos acesso na época. De forma que eu precisava voltar para casa de meus pais para assistir anime mais confortavelmente. E é claro, eu fazia isso só com K-on.

Era um ciclo que se repetia a cada semana, toda a quarta-feira eu assistia o episódio antes de dormir, na quinta de manhã eu o reassistia com legenda, e no sábado, assim que eu pudesse conectar o notebook na sala, eu assistia a terceira vez.

Para mim nada será tão grande quanto K-on foi durante o início dos anos 2010s, não tenho dúvidas de que o seu sucesso tenha sido um dos responsáveis para que a KyoAni tenha se tornado tão amada pelos fãs de animação por todo o globo, ainda que, como dá para perceber com a quantidade de excelentes títulos acima e também abaixo desse aqui, K-on esteja longe de ser o único anime adorado feito pelo estúdio.

Eu simplesmente não eu sei dizer o quanto eu amo K-on e suas personagens. Ou o quantas vezes o arco, e principalmente a música proveniente dele — Tenshi ni Fureta yo — , de despedida da Azusa de suas senpais me fez chorar ao longo desses anos, nem quantas madrugadas passei reouvido as músicas da série enquanto lia suas letras e traduções.

Sempre tive vontade de escrever sobre K-on, relacioná-lo com o recente sucesso de Yuru Camp, com a insurgência dos animes de idol como IdolM@ster, Love Live e BanG Dream, especulando sobre o que exatamente fez, ou o quão grande realmente foi, o seu sucesso. Ou mesmo falar sobre a expressão “novo k-on” bastante recorrente há alguns anos na comunidade, falando sobre o quê essa expressão realmente quer dizer, o que é necessário para um anime ser considerado um novo K-on, ou mesmo tentar “adivinhar” de onde esse novo K-on poderá surgir.

Por essa razão é de cortar o coração o fato de que a primeira vez que escrevo sobre um anime que é tão importante para mim seja pelas razões que me levam a escrever esse texto.

Quando Nichijou entrou na minha vida eu já assistia animes semanalmente como o faço hoje em dia, e por conta disso ele é o primeiro anime da KyoAni que acompanhei do começo desde sua estreia.

Confesso nunca me conectei tanto com Nichijou como outras pessoas, mas isso não quer dizer que seu sucesso entre os animes de comédia não seja mais do que justificado. Entre todos os animes de humor nonsense ele é o que mais se aproxima da realidade cotidiana e o único que, de forma ou de outra, une toda as tribos.

Talvez um dos motivos para Nichijou não ter me impactado tão fortemente quando poderia ter, seja por conta do fato de que, na mesma temporada, outro anime com humor nonsense e cotidiano tenha chamado mais a minha atenção; Danshi Koukousei no Nichijou, que não continuou a ser exibido na temporada seguinte como Nichijou.

É claro, isso não tira em nada o mérito do anime. Ele é, ainda hoje, um dos animes mais divertidos que alguém pode assistir, e provavelmente uma excelente recomendação para quem não está muito envolvido com anime, ou para quem começou a assistir anime recentemente.

Nichijou é dono das mais hilárias e bem animadas cenas de comédia, de modo que eu não me surpreenderia se ele fosse recordista de presença em copilados de cenas mais engraçadas em animes no YouTube.

Hyouka é atualmente, junto de Hibike! Euphonium, o meu anime favorito, e é bem difícil explicar o porquê de, dentre tantos animes lá fora, eu enxergar justamente Hyouka dessa forma.

Sim, ele fez parte da minha vida em um momento importante dela, estava começando a estudar na faculdade em que me formei no curso de letras, sim foi a época em que eu fiquei ainda mais íntimo com a escrita (O que é uma palavra interessante de dizer porque foi justamente a época da minha vida em que mais escrevi contos eróticos). Mas nunca realmente associei o anime a qualquer uma dessas coisas.

Talvez seja pelo fato d’eu me identificar com a personalidade do protagonista, sua preguiça e vontade de viver de maneira calma, talvez seja o meu interesse por histórias de mistério, ou melhor, histórias de detetive, o romance silencioso entre Oreki e Chitanda, ambas as coisas ou talvez nenhuma delas.

O fato é que Hyouka é um anime que eu recomendaria para qualquer pessoa. Não que eu ache que ele seja uma obra que agrade a todos os gostos, até porque nenhuma obra é assim, mas porque simplesmente há muito o que gostar em Hyouka, desde o já citado romance, até o humor que o anime usa para rechear a sua narrativa, o modo amplo como ele lida com os vários mistérios que entram em sua trama, ou mesmo o quão bonita é animação, mas até ai beleza em animação não é algo que falte em outros títulos dessa lista.

Isso sem falar que a Chitanda é uma excelente waifu, e têm concorrência dentro da série. Além disso, ela é dublada pela Satomi Sato, a mesma dubladora da Ritsu de K-on, e esses dois trabalhos mostram bem as capacidades da dubladora pois são duas personagem com personalidades e apelos bem diferentes entre si.

O que pode parecer um detalhe pequeno, mas foi a partir desse momento em que eu comecei a prestar a devida atenção no trabalho dessas pessoas que, através da voz, dão vida a personagens tão maravilhosos.

Chuunibyou Demo Koi ga Shitai! é o primeiro anime de romance da KyoAni após das adaptações da Key. Ele certamente não é um anime tão emocionante triste e envolvente quanto os outros títulos da KyoAni, mas é definitivamente uma boa comédia romântica.

O anime também foi o primeiro a introduzir o conceito de Chuunibyou ao público geral, e acabou popularizando o arquétipo para demais séries de comédia.

É difícil dizer quantas obras foram influenciadas pela Rikka, pois a série não inventou esse conceito, apenas se baseou nele para construir o seu humor e narrativa. Mas se hoje amamos personagens como a Megumin (Konosuba), Ando (InoBato), Yoshiko (Love Live) ou mesmo a Ranko (IdolM@ster), é porque a série chamou a atenção para esse tipo de personagem, dando destaque e oportunidade para que esses personagens pudessem crescer e se tornarem populares dentro das diversas comunidades de anime mundo afora.

Se você quer um exemplo do quão vasta é a capacidade da KyoAni em criar mundos coloridos e cheios de vida assistindo a apenas um anime, esse é Tamako Market.

Se em K-on a KyoAni já havia criado um cast de figurantes tão interessantes que mereceriam um anime próprio, em Tamako Market eles são o prato principal.

Tamako Market é ambientado em um distrito comercial, uma verdadeira galeria de variedades, em que cada casa, cada lote da rua, é ocupada com uma loja diferente. uUma floricultura, um café, uma loja de doces, a loja da família da protagonista (uma loja de mochi) e por ai vai.

Poucos animes apresentam um ambiente tão real, tão palpável e interessante como Tamako Market. O que é importante na obra porque ajuda ao telespectador a entender o porquê da própria Tamako se importa com aquele lugar, afinal, não é exagero em dizer que aquela é a segunda casa dela, ou melhor ainda, uma extensão da casa dela.

Mas eu não poderia falar sobre Tamako Market sem mencionar o filme. Diferente da série, Tamako Love Story foca na relação entre a protagonista e seu amigo de infância, que quer confessar os seus sentimentos para ela, mas não sabe como expressar aquilo que sente, uma situação que qualquer pessoa que já amou alguém pode se identificar com.

Apesar de bastante simples em um primeiro momento, a relação entre Tamako e Machizou é muito bem trabalhada durante todo o filme, ao ponto dela se tornar algo bem mais complexo do que se imagina durante a série. Ao mesmo tempo, o filme trabalha outro elemento pouco explorado durante a série, que é a relação entre a Tamako e sua falecida mãe, de forma bastante pura e singela.

Eu não saberia dizer se é realmente necessário ter assistido a série para poder aproveitar o filme, porque, por um lado, o filme aborda um ponto importante na vida do casal: O final de seu colegial. Em que a possibilidade de sair do distrito comercial se aproxima da realidade e a decisão do quê fazer no futuro deve ser feita logo. E essa decisão só tem o peso que tem para o telespectador se ele compreende o quão importante é aquele lugar tanto para Tamako como para o próprio par romântico dela, Mochizou.

Por outro lado, eu entendo perfeitamente que a série e o filme podem ser atrativos para públicos diferentes, pois a série é um slice of live sobre a Tamako e sobre o Market, enquanto o filme tem esse foco entre os dois personagens. Por conta disso dizer para quem potencialmente se sensibilize com o filme assistir primeiramente a série é afastar parte do público do mesmo. E como Tamako Love Story já é uma das obras da KyoAni menos apreciadas entre os fãs de anime, afastar o público é a ultima coisa que desejo para ela.

Sendo assim, se você quer assistir uma história de amor pura e simples, mas cativante, Tamako Love Story pode ser uma boa pedida.

De todos os animes da KyoAni, Free é o único que eu sinto que não foi feito para mim. Você pode pensar que o motivo disso seja o fato dele claramente ter sido criado pensando em um público feminino, por conta do fanservice, dos personagens musculosos e ou a tensão sexual que há entre os caras, mas a questão não é bem essa. A verdade é que eu nunca me interessei muito por animes de esporte, e por conta disso Free nunca me foi motivo para excitação.

Apesar disso há muito o que ser apreciado nesse anime. Desde o próprio fanservice ao redor dos personagens masculinos, que é algo que simplesmente não se vê muito em animações de modo geral, e que em free é muito bem feito e na medida certa, ao ponto de não incomodar a quem não se interessa por esse elemento. O próprio modo como o anime lida com o humor na série, e como esse flerta com o fanservice natural do anime.

E é claro, a animação. Se os animes da KyoAni já se destacavam pelo trabalho cuidadoso e extremamente apaixonado do estúdio em tirar o máximo proveiro de cada uma de suas obras, Free foi o anime que mais elevou os parâmetros do que é considerado boa animação. Porque, me’deus, como a água é bonita nesse anime. Até então nunca pensei que diria isso, mas a partir de Free nunca mais vi água da mesma maneira.

Sempre que a água virava um destaque em algum anime, seja pelo anime girar em torno do mar, mostrando personagens mergulhando, em episódios de praia ou com os personagens entrando em uma piscina, a comparação com Free se tornava inevitável. E mesmo na vida real, alguma vez que visitamos uma cachoeira, nem me lembro exatamente onde, e pensar, no meio de tantos elogios àquela obra da natureza, que “em Free seria ainda mais bonito”.

Kyoukai no Kanata por outro lado, foi um anime que não me marcou tanto pelo hype que ele havia gerado. Afinal, esse era o primeiro anime de ação desde que o estúdio passou a cuidar da adaptação de Full Metal Panic!, então a expectativa em torno dele não poderia estar mais alta.

E o resultado dessa alta expectativa não poderia ter sido mais óbvia, eu acabei me decepcionando bastante com o anime. Mas acabou não sendo uma decepção que perdurou até o final. Pode ter demorado bastante, mas a partir da metade da série, mais especificamente episódio em que os personagens fazem um mini clipe de música, que comecei a apreciar a série por aquilo que ela realmente apresentava, as interações entre as personagens, suas personalidades, o humor, o modo como a série lida com os seus poucos elementos de fantasia e sobre natural e, é claro, o apelo que um simples par de óculos pode ter.

Quando Amagi Brilliant Park foi ao ar eu já era um usuário regular da Crunchyroll, e por isso tinha adotado a prática que acompanhar apenas o que estava disponível na plataforma no decorrer de cada temporada e, ao final dela, assistia os outros títulos que tinham chamado a minha atenção de uma forma ou de outra.

E infelizmente Amagi Brilliant Park não faz parte dos animes que foram licenciados pela plataforma aqui no Brasil. Talvez por isso, e ela decepção por qual passei com Kyoukai no Kanata, acabei não me animando muito com o título, e mesmo quando eu o assisti não saí dele muito surpreso.

Ainda assim, ele é um anime bastante divertido, e vejo nele diversos elementos que me agradam nos animes mais atuais da KyoAni de modo geral. Talvez pelo fato d’eu particularmente não me interessar por parques de diversão, nunca ter me animado em andar em montanhas-russas, ou por não ter me apegado a nenhum personagem de Amaburi, que o título não tenha sido tão marcante para mim como outras menções dessa lista.

Assim que Hibike! Euphonium surgiu no horizonte, a expectativa de todos, e minha também, era que ele fosse uma espécie de sequência espiritual de K-on!, ou um novo K-on, sei lá o que essa expressão signifique aqui, por assim dizer.

Afinal ambos tinham muita coisa em comum; como o fato das protagonistas serem garotas do colegial em um clube de música, suas capas serem parecidas e por ser fácil traçar um paralelo entre as protagonistas de K-on com as primeiras personagens de Hibike a serem mostradas.

Isso, aliado ao fato de não sabermos muito sobre a verdadeira trama de Hibike até o seu lançamento, nos fez preencher as lacunas da expectativa com aquilo que já conhecíamos dos trabalhos anteriores da KyoAni.

Por isso foi uma enorme surpresa quando, logo nos primeiros episódios, Hibike se mostrou ser muito mais sobre uma narrativa obtusa levemente escondida entre as falas, e as não falas, dos personagens da trama, no lugar de uma comédia moe baseada na fofura e na alegre amizade das protagonistas.

E é claro, como já foi spoilado quando falei um pouco sobre minha relação com Hyouka, essa surpresa fora mais muito mais do que bem vinda. E tenho certeza de que não amaria tanto Hibike se ele apenas seguisse os passos de K-on, porque bem no fundo o que eu realmente queria não era que a KyoAni fizesse K-on novamente, mas sim algo que me envolvesse tanto quando K-on me envolveu na época em que a segunda temporada foi ao ar.

Não posso dizer que Hibike foi tão intenso e presente em minha vida quanto, mas ele também não ocupa o lugar de meu anime preferido atoa. Enquanto sou apegado aos personagens de K-on pela forma com que eles ocuparam um bom espaço de minha vida quando eu estava mais solitário, os de Hibike me conquistaram pela profundidade e complexidade.

Ninguém é verdadeiramente honesto em Hibike, todos os personagens são como livros fechados, todos eles escondem suas reais emoções, seus propósitos e segredos. Mas assim como livros, somos capazes de adivinhar o que há dentro, o que eles escondem um dos outros. São pequenas aberturas, falas que deixam escapar aquilo que realmente pensam, e ações que sugerem, ainda de leve, o que realmente sentem. São pequenas espiadas, rápidas, que por vezes passam despercebidas por quem as vê.

Tanto a série como o filme de Hibike, Liz to Aoi Tori, trabalham esse elemento de maneira excepcional, permitindo que possamos sentir e compreender os sentimentos de cada um dos personagens da trama, sem que essa, necessariamente, apresente-os de maneira explícita.

Myriad Colors Phantom World é o anime dessa lista que me faz questionar se realmente vale a pena realmente mencionar todos os animes da KyoAni que de uma forma ou de outra entraram e minha vida. Porque, apesar de ter os seus momentos, Myriad Colors Phantom World não é particularmente muito bom, e eu estou longe de ser um fã da série.

E essa nem sequer é uma opinião impopular. Muitas das pessoas que conhecem o anime volta e meia se referem a ele como “o pior anime da KyoAni”, e por mais que eu concorde com essa afirmação, e muitas vezes a repita, ela diz muito mais a respeito da própria KyoAni do que o anime em questão.

Porque, veja bem, ainda que, dessa lista, Musaigen seja o último anime que eu imploraria por uma segunda temporada, eu sem sombra de dúvidas a acompanharia se ela viesse a existir.

E nem digo isto pelo fato de ser mais um anime do meu estúdio favorito para assistir, ou pela certeza que essa terá uma animação vastamente superior à média das outras animações feitas para televisão. Mas porque, ainda que seus personagens não sejam tão complexos quantos os de Hibike, tão carismático quanto os de K-on, sua história não seja tão emocionante e envolvente quanto Clannad, o anime não pareça ir a lugar nenhum até chegar aos seus episódios finais, e ainda que ele seja um anime fraco para os padrões da KyoAni, ele é, na pior das hipóteses, um anime mediano, divertido e interessante o bastante para não ser uma completa perda de tempo.

E isso, o modo como as pessoas ficam, de certa forma, bravas pela KyoAni ter animado essa história, apenas mostra o quanto nós como fãs de anime amamos e admiramos o trabalho desse estúdio. Ao ponto de desejarmos que apenas as melhores histórias, aquelas que são verdadeiramente dignas, recebam o carinho e a dedicação de um estúdio tão talentoso.

E apesar de ser tão negativo aqui, eu de forma alguma odeio, ou mesmo desgosto de Musaigen. Pelo contrário, lembro bem que, na época em que o anime começou a ser lançado, eu fiquei bem triste ao ver a quantidade de pessoas que se diziam desapontadas com o título, e quantas pessoas droparam o anime na época. Porque, eu entendo bem essas pessoas, não faz sentido assistir algo que não te agrada, mas, ao mesmo tempo, por mais que eu fale mal de Musaigen agora, na época, eu ainda me divertia com cada episódio semanal, com cada uma de suas estranhasses. E por isso, por mais que ele seja o anime que menos gosto dessa lista, que ele merece estar nessa lista, e é por isso que ele ainda é especial para mim.

Se após Kyoukai no Kanata minha confiança no estúdio estava um pouco abalada, com Hibike sendo um mero ponto fora da curva de uma sequência de obras que não me impactavam tanto quanto os títulos anteriores do estúdio. Miss Kobayashi’s Dragon Maid veio para reacender o meu amor pelo trabalho da KyoAni.

Ele é, provavelmente, um dos títulos mais populares da atualidade em termos de comédia, ou até mesmo em animações de um modo geral. Sendo não muito difícil achar as imagens da serie sendo usadas como imagens de reação, conteúdo para memes, avatares ou mesmo para espalhar a fofura da Kanna mundo a fora.

Dragon Maid é a mistura perfeita daquilo que torna tanto Nichijou como K-on exemplos tão excelentes de animação. Não apenas a direção é impecável, como há um balanço magistral entre as questões mais básicas do cotidiano adulto, com a mais pura fofura, a fantasia e o humor nonsense da série.

Eu não exagero quando digo que não consigo imaginar alguém que consiga, de coração aberto, não gostar de Dragon Maid.

Koe no Katachi apareceu na minha vida em um momento extremamente importante porque, quando ele finalmente ficou disponíveis para nós no ocidente, eu estava lidando, praticamente diariamente, com a depressão, um dos temas trabalhados brilhantemente pelo filme.

E quando eu digo lidar com a depressão, não me refiro apenas ao fato de que foi mais ao menos nessa época em que a psicóloga com quem fazia terapia tenha sugerido que eu sofresse do transtorno, ainda que em um degrau mais leve, mas também porque pessoas bem próximas de mim estavam sofrendo desse male bem mais do que eu.

E ainda nessa época, estava na reta final para me formar na faculdade, já tinha feito o estágio probatório obrigatório que toda faculdade de licenciatura exige, mas ainda me faltavam algumas horas complementares para poder concluir o curso. E, dentre os vários cursos que fiz, as aulas que assisti, fiz um trabalho um assunto que estava em voga. O suicídio.

Nesse trabalho, eu precisava planejar uma atividade para trabalhar o tema em sala de aula, e é claro a atividade que bolei envolvia assistir séries e filmes que abordassem o tema de alguma forma. Não sei dizer se a atividade que propus foi aplicada em alguma sala de aula, mas no texto que enviei para professora responsável, fiz uma lista razoável de indicações que incluíam alguns filmes e séries. E é claro, muitas animações.

E aqui creio que não surpreendo ninguém dizendo que Koe no Katachi não apenas pertencia a essa lista, junto de coisas como o meu episódio preferido de Osomatsu, como era o primeiro da lista, e o próprio motivo dessa lista existir.

É até engraçado pensar que talvez a minha proposta de atividade tenha sido motivo de, em algum lugar próximo de mim, uma professora do ensino médio ou fundamental ter superado o seu preconceito contra animes e molhado alguns lenços com Koe no Katachi.

O filme também vai de encontro com várias assuntos que foram estudados no decorrer do meu curso de Letras. Desde detalhes referentes a teoria da linguagem, até aquilo que estudei na disciplina de LIBRAS e Códigos da Comunicação. E é claro, pelo fato do curso em que me formei ser voltado para formação de professores de língua, por mais que eu não exerça a profissão, o assunto bullying em sala de aula não me era nem um pouco alienígena.

Eu não poderia recomendar mais Koe no Katachi porque, não apenas é relativamente fácil ter acesso a ele por meios legais hoje em dia, mas ele é uma das coisas mais bonitas que a KyoAni já produziu. Não apenas visualmente, mas de uma forma poética, sensível, que é difícil enxergar em outras obras, não apenas animes.

É bastante difícil evitar esses sentimentos, mas sempre que surge a notícia do falecimento um artista ou autor de minha estima, ou cuja obra sempre tive interesse em conhecer, sou preenchido pela vontade assistir tudo o que ainda estava pendente, consumir cada obra até então desconhecida por mim.

Ao mesmo tempo, vem em seguida um sentimento de culpa, de estar sendo hipócrita por desenvolver essa vontade apenas agora, no pós-morte de tal criador.

E com o incêndio da KyoAni não foi diferente. Minha real vontade é de rever cada uma das obras favoritas do estúdio, de Kyoukai no Kanata até K-on, de Air até Koe no Katachi. Mas para escrever esse artigo, decidi que deveria assistir um anime, e apenas um, da KyoAni, dentre minhas poucas pendências com o estúdio, para que ele ficasse verdadeiramente completo. E é claro, não descartando aqui possibilidade de reassistir os títulos que tanto elogiei nessa lista, após a publicação desse texto.

Eu poderia ter escolhido Tsurune, que desde o ano passado ocupa um espaço na minha lista de anime da Crunchyroll, para terminar essa lista. Ou mesmo Full Metal Panic, que apesar de não ser inicialmente e inteiramente feito pela KyoAni é considerado o seu primeiro anime. Mas desde o começo já estava bastante claro para mim que esse anime deveria ser Violet Evergarden por dois motivos distintos.

O primeiro deles mora no fato de que eu já tinha assistido, e gostado, dos dois primeiros episódios quando ele foi disponibilizado pela Netflix lá em janeiro de 2018, mas acabei não acompanhando o anime pelo fato da Netflix ser um pouco fora de mão para mim.

Por outro lado, o primeiro episódio já havia deixado bem claro que o luto seria um dos temas abordados pela série, e por isso não vejo como outro título possa ser mais adequado que Violet Evergarden para esse momento.

E minha intuição não poderia estar mais correta.

A história de Violet Evergarden é tão bela quanto o próprio visual da série. Apesar do anime ser bastante fantasioso em alguns aspectos, a forma como ele lida com o luto, com a morte, com despedidas e com as diversas perdas que sofremos no decorrer de nossa vida não apenas é bastante realística como não poderia ser mais sensível e tocante em um momento como esse.

Seguir a história de Violet aprendendo a como lidar com os seus sentimentos e com os daqueles que a rodeiam foi como enxergar parte de mim em um espelho. É quase impossível não traçar um leve paralelo entre a minha própria jornada, mais que a de Emília ou Pinóquio, pelos animes da KyoAni com a própria narrativa pela qual a automata atravessa para se tornar cada vez mais humana.

Se hoje sou capaz de me emocionar, simpatizar e chorar com as histórias de outras pessoas é porque, ao longo de minha vida, fui exposto a histórias que me permitiram me apegar, amar e me apaixonar por seus personagens, e sofrer junto deles. E é claro, a KyoAni fez parte de muitas dessas histórias.

Não pude deixar, então, de lembrar-me da primeira fez que chorei assistindo um anime. Foi um evento bastante especial para mim, quando encarei meu rosto desolado em frente a um espelho, afinal, aquela era a prova de que tinha sim sentimentos, de que meu coração não era feito de pedra. Ainda que fosse apenas a primeira lágrima solitária de muitas outras que estavam por vim. E, acredite, não foram poucas.

Talvez por conta disso, Violet Evergarden tenha me impactado muito mais agora que revisitei minhas memórias e percebido o quão importante foi esse estúdio no decorrer da minha vida, o que fez com que eu me identificasse ainda mais com a personagem.

Mas o anime não me impactou diretamente apenas pela minha relação com o estúdio, ou mesmo com animes de um modo geral, mas também com o quão bem a série consegue captar as múltiplas facetas e a importância e variedade da escrita.

Seja para registrar ideias, preservar acontecimentos, transmitir conhecimento, comunicar sentimentos, identificar coisas e pessoas, ou mesmo oficializar tratados. Ainda que de forma pequena ou sutil, cada uma das modalidades, das utilidades que damos para a escrita estão representadas de uma forma ou de outra dentro da série.

E, mais importante do que isso, o anime apreende muito bem o quão é difícil organizar e transmitir, através da escrita, nossas ideias e sentimentos. O que não poderia conversar mais diretamente comigo porque… afinal… não é justamente isso que estou, em meio a tanta dor e confusão, fazer aqui?

Eu não poderia me despedir desse texto de outra forma senão pelas palavras que usei para expressar aquilo que sentia no momento em que a Crunchyroll abriu um espaço para que nós, os fãs, pudêssemos mandar nossas mensagens para o estúdio.

Antes de qualquer outra coisa eu gostaria de dizer obrigado.
Obrigado por terem despertado em mim o fascino pela mídia que nós no ocidente chamamos de “anime”.
Obrigado por terem criado mundos tão coloridos, tão vastos e tão cheios de vida.
Obrigado por serem minha companhia nos melhores, e piores, momentos de minha vida.
Obrigado por mexerem diretamente com o meu coração, me fazendo chorar, sofrer, rir e pular de alegria.
Obrigado por serem o meu estúdio preferido.
Nem todos os obrigados no mundo seriam capazes quantificar o quanto de gratidão eu sinto por vocês.
E tamanho sentimento, tamanho amor que tenho pelo trabalho de todas as pessoas de sua equipe apenas torna ainda mais dolorosa a tragédia que testemunhamos, distantemente, aqui no outro lado do mundo.
É de infinita tristeza saber que aqueles por quem tenho tanto apreço estão sofrendo uma barbárie tão cruel e tão injustificável como essa.
Envio minhas mais singelas condolências e meus pêsames para amigos e familiares de todas as vítimas.
Desejo que venham dias melhores daqui para frente, e que as boas memórias prevaleçam sobre as más memórias que essa tragédia nos deixou.
Porque o maravilhoso legado deixado por essas pessoas ecoará através dos tempos.

Obrigado KyoAni, 愛してる.

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Marcelo Hagemann Dos Santos
Marcelo Hagemann Dos Santos

Written by Marcelo Hagemann Dos Santos

Rapaz de humor duvidoso que entrou essa de escrever sobre animes recentemente. Ex-aluno de filosofia e graduado em Letras, mas sempre estudando.

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