Minha Relação de Amoródio com o Crunchyroll
Desde que foi anunciado que o serviço de streaming atuaria dentro do território nacional, tenho visto reações bastante sentimentais, para não dizer raivosas, direcionadas para o Crunchyroll. Desde pensamentos de que o serviço iria acabar com a cultura de fansub dentro do Brasil, até questões que envolvem a viabilidade de um serviço dessa natureza, considerando a velocidade padrão da internet na época, ou a quantidade de animes disponíveis.
O tempo passou e muitas dessas questões foram sanadas, algumas esperanças se tornaram realidades, assim como certos medos, mas não há dúvidas de que a vinda do Crunchyroll trouxe grandes impactos para o cenário brasileiro e mudou bastante a forma como nós otakus consumimos essa mídia. Entretanto, o objetivo desse texto não é falar da história da plataforma por aqui, nem levantar os modos como a empresa impactou a comunidade (apesar de serem temas interessantes), mas sim olhar para a plataforma como ela é hoje e apontar os problemas e pontos positivos que ela possui, da forma mais franca, transparente, e sincera possível.
A primeira coisa que eu gostaria de tirar do caminho é a discussão que sempre é levantada quando alguém pergunta se vale ou não assinar o Crunchyroll aqui no Brasil (além da própria qualidade do serviço), que é a ideia de que ao assinar o Crunchyroll você está apoiando a industria de animes no processo.
Eu tenho dois pontos a cerca dessa discussão, o primeiro é o que está praticamente sempre em pauta; se é realmente verdade que assinar o Crunchyroll é apoiar a industria. Não vou entrar em detalhes do como essa discussão evoluiu com o passar do tempo, mas inicialmente tínhamos dois lados desse debate: Um deles dizia que sim, usar o Crunchyroll era um modo de apoiar a industria, e o outro dizia que não, que assinar o Crunchyroll só ajudava o próprio Crunchyroll.
Hoje a discussão está um pouco diferente, parece haver um acordo dentre os dois lados de que sim, assinar o Crunchyroll é uma forma de apoiar a industria, porém uma forma extremamente ineficiente de fazê-lo, já que apesar do Crunchyroll repassar parte da arrecadação para quem realmente produz essas animações e ajudar a financiar alguns desses projetos, a maior parte do montante fica com a própria empresa, tanto para cobrir os gastos que ela tem com o serviço como para custear os seus próprios eventos e projetos.
E é com essa afirmação que gostaria de entrar na discussão com o fato de que, mesmo no Japão, a maioria das pessoas não contribui tanto assim para apoiar a industria quanto eu ou você pensávamos.
Se pararmos para visualizar em como alguém comum consome essa mídia no Japão podemos imaginá-lo acompanhando pela TV aberta, talvez assinando canais especializados em anime da TV paga. Ou ainda, caso trabalhe, estude, ou tenha que dormir no horário em que esses são exibidos, programe um gravador de DVD para poder assisti-los quando tiver tempo livre. Ou que assine um serviço de streaming para ter a comodidade de ver essas animações quando bem entender. Ou também essa pessoa tem a opção de esperar os DVDs serem lançados para alugar, ou emprestar de um amigo, e assistir em casa, mas dificilmente o vejo comprando os DVDs de tudo o que quiser assistir, no máximo um ou outro título que realmente goste.
De fato esse cidadão tem muitas opções para acompanhar suas séries, mas todas elas tem um ponto em comum: São entregues a ele através de um intermediário, seja a TV aberta, o serviço de TV a cabo, o tio da locadora ou a própria empresa que fabricou o DVD comprado. O dinheiro nunca vai direto para quem realmente produziu essas animações, sempre há uma esponja para enxugar a sua parte.
Ou seja, qualquer a forma de apoiar a industria será relativamente ineficiente pelos exatos mesmos motivos que tornam o Crunchyroll uma forma ineficiente de apoiar a industria: Porque a industria não é composta apenas pela staff do anime, pelo diretor, roteirista, dubladores, animadores ou autor da obra adaptada, mas também por todas as engrenagens que tornam possível essas obras chegarem até você (isso é, se contarmos apenas pelos meios licenciados, porque obviamente piratear nunca vai contribuir para pagar o salário de nenhum animador). E por bem ou por mal a Crunchyroll faz parte desse conjunto de engrenagens.
O que nos leva ao segundo ponto da discussão que não é levantado com tanta frequência, mas é ainda mais importante quanto, e pode ser resumido na seguinte indagação: Qual é dessa obsessão tão grande por apoiar a industria no meio Otaku?
É serio, não vejo essa questão ser levantada com tanta frequência em nenhuma outra mídia, seja qual for. É até entendo que animes foram consumidos através da pirataria por tanto tempo que é compreensível que um fã de anime sinta-se mal por nunca ter dado um centavo a quem te trouxe tantas coisas boas.
Por outro lado, antes de sermos fãs de alguma coisa, somos consumidores e, como consumidores, só podemos gastar nosso dinheiro em produtos e serviços. Se os serviços e produtos que nos são oferecidos não são de nosso interesse, ou não têm a qualidade que queremos, não faz sentido algum perder tempo e dinheiro com eles. E consumir esse tipo de coisa apenas com a desculpa de apoiar a industria é uma neurose que tem que acabar.
É claro, vivemos em uma era em que financiamento coletivo é algo possível, podemos financiar projetos específicos ou mesmos artistas individuas com poucos intermediários. Porém, vale lembrar que cada financiamento para um projeto vai para aquele projeto em específico, não para a industria como um todo, e se você não tem interesse em apoiar aquele projeto obviamente não faz sentido você financiá-lo com a mesma desculpa de antes.
Com isso podemos olhar para a Crunchyroll com aquilo que ela realmente é: Uma empresa que nos oferece um serviço de streaming de anime e que permite que nós consumamos esse serviço através de uma assinatura ou de forma gratuita sob algumas condições, como ter que esperar uma semana para ver os episódios mais recentes, e ver propaganda a cada episódio assistido.
Com isso podemos voltar a pergunta se vale ou não a pena assinar o Crunchyroll, e há duas formas de enxergar essa questão.
A primeira é de listar quais são as vantagens de comprar o pacote premium em vez de utilizar o stream de forma gratuita. E se você é como uma grande parte das pessoas que consome animes regularmente sabe muito bem que não ter acesso aos episódios mais recentes dos animes da temporada é uma grande desvantagem pra quem não paga pelo serviço, ao ponto de ser praticamente improvável que alguém acompanhe animes atuais dessa forma.
Fora isso, todos os outros episódios estão disponíveis para os não-assinantes do serviço, de modo que a única vantagem para quem assina é a falta de propaganda, o que é um ponto bem relativo para cada um. E, a última vantagem seria o desconto da loja do Crunchyroll que não irei me ater porque não sei o quão competitivo são os preços da loja do Crunchyroll em relação a outras lojas, então não tenho como dizer o quão vantajoso são esses descontos.
A segunda forma de ver essa questão é pensando no serviço em si. Afinal, vamos ser sinceros, quem não tem assinatura do Crunchyroll muito provavelmente vai acompanhar seus animes de outras formas, como outros sites (licenciados ou não) de stream, baixando de fansubs e por ai vai…
A primeira promessa que o Crunchyroll faz é que todos os episódios vão estar disponíveis após uma hora da exibição no Japão, e nesse quesito a empresa entrega aquilo que promete. São bem raras as vezes que um episódio atrasa, e na grande maioria das vezes a culpa não é exatamente do Crunchyroll, mas porque a própria exibição no Japãoatrasou, a produção do episódio teve algum problema, ou aconteceu algum tipo de conflito com a licenciatura daquele show que obriga a empresa a atrasar a disponibilidade do episódio.
Quanto a legendas, não posso dizer com precisão o quão boas elas são, pois o meu Japonês não é tão bom assim, mas se tivesse alguma reclamação seria o fato de que nem sempre a legenda é literal à fala dos personagens. Por exemplo, se um personagem chama outro de “senpai” acontece de na legenda estar escrito o nome do personagem chamado em vez do próprio termo dito ou uma tradução dele. Ou seja, nada que altere o entendimento da série em si, e nem todos os shows são assim, provavelmente é a preferência de um ou outro tradutor, não a regra.
Por outro lado, é realmente uma pena que o Crunchyroll tenha adotado essa política de não legendar aberturas e encerramentos. Eu sei que música é particularmente difícil de traduzir, mas há alguns casos que a música muda a cada episódio, e às vezes reflete, ou complementa, o que aconteceu no episódio. Enfim, mesmo que para maioria dos títulos isso não faça tanta diferença, é algo que está faltando, não importa como se olhe para esse ponto.
Mas é na qualidade do streaming que ela dá seus verdadeiros tropeços. Primeiro temos o fato de que não, o player que a Crunchyroll nos oferece no navegador está longe de ser bom. Não apenas ele ainda utiliza flash, que é uma tecnologia que é cada vez menos utilizada, como simplesmente não é uma boa ferramenta caso você queira voltar para algum ponto específico do episódio, o player não carrega muito além de um minuto do ponto atual de reprodução e esquece completamente daquilo que já foi reproduzido. O que pode ser uma questão de economia de memória, mas que é bastante irritante se você quiser voltar o episódio para, por exemplo, tirar uma screenshot de uma cena específica e fazer um meme.
Mas sim, a Crunchyroll oferece muitas alternativas ao player do navegador e está presente em várias plataformas, incluindo o finado WiiU, mas os players desses consoles e dos smartphones não são exatamente ideias, e é relativamente comum um episódio demorar para ficar disponível nesses aplicativos (o que inclui o aplicativo de windows 10). De qualquer forma, é uma alternativa válida ao ponto de que não ter nenhum aplicativo para TVs smart ser um ponto comumente apontado como negativo para muitas pessoas, afinal, poder assistir anime direto na televisão, console ou celular é prático e simples, basta que seja rápido de colocar o episódio, e que ele rode sem problemas para satisfazer a maior parte das necessidades do usuário.
Outro problema é a falta de estabilidade do próprio streaming da Crunchyroll. Enquanto em uma internet de 10 Mega não tenho nenhum problema para assistir vídeos no YouTube em HD, e o mesmo pela Netflix, preciso ter sorte para, na mesma internet, a player da Crunchyroll dar conta de reproduzir qualquer episódio em 480p. O que, nessa mesma internet, me obriga a utilizar o aplicativo de windows 10, que segundo o suporte da Crunchy possui uma maior estabilidade de conexão em relação ao navegador.
O que pelo uso posso dizer que é verdade, mas ainda assim a conexão não é exatamente estável. A qualidade do vídeo muda constantemente para ajustar a velocidade do download, o que provoca algumas travadas súbitas. E nem preciso dizer que isso não é o ideal. Além disso, o aplicativo para o windows 10 é o único dentre todos os que a empresa oferece que não possui uma configuração de qualidade de reprodução, estando sempre no modo automático. Sem falar que o aplicativo tem o estranho costume de volta e meia fechar do nada ao ser minimizado, maximizado, ou posto em modo de exibição de tela inteira.
Mas tudo bem, é bastante fácil colocar a culpa nessa minha internet. Afinal, quando estou na minha internet de sempre (que é de 35 mega) o aplicativo não tem problemas em rodar o vídeo inteiro em full HD (com exceção dos primeiros frames, que sempre carregam em baixa qualidade, por algum motivo), mas é um erro querer esperar que todos os seus consumidores tenham uma boa conexão o tempo todo, ainda mais aqui no Brasil, e seria bastante interessante que a Crunchyroll não apenas entrasse em contado com os provedores de internet para resolver esse tipo de problema, como também adotasse uma política que permitisse que seus consumidores armazenassem em seus dispositivos episódios que gostariam de assistir offline, permitindo que os usuários da plataforma acompanhassem suas séries mesmo em conexões ruins, ou até mesmo quando não possuem conexão alguma, como em viagens do ônibus.
Outra coisa que a Crunchyroll poderia adotar em seu serviço de stream seria a opção de pular aberturas e encerramentos de forma automática, ou seja, um modo especial para quem quiser maratonar séries de anime no menor tempo possível, sem precisar se preocupar em pular manualmente as aberturas, encerramentos, prévias dos episódios seguintes ou mesmo recapitulações de episódios passados. Ou ainda podemos ir mais além, e por quê não sinalizar quando um episódio é filler e perguntar a quem está assistindo se não quer pulá-lo?
E por fim, sobre o tão prometido player em html5, infelizmente não pude testá-lo para ter certeza se ele resolve os problemas do player antigo porque, adivinhem, a disponibilidade dele está atrelada ao seu ip, e, no meu caso, esse ip é o da minha internet de 10 mega e como já podem imaginar; não, o player novo tem não tem uma conexão melhor que a do aplicativo, então… É, bom trabalho, eu acho…
Ou é o que eu diria se tivesse publicado nesse texto no mesmo dia que comecei a escrevê-lo. Porém, no meio do caminho o novo player ficou disponível para mim também na internet de sempre, então decidi segurar esse texto um pouco mais, e testar o player. Testei, e posso dizer que não é nada de mais. É um player bastante eficiente no básico, reproduzir o episódio, oferece a opção de trocar a qualidade do vídeo sem precisar recarregar a página, como antes era necessário, e finalmente podemos ver o quanto do episódio já foi carregado. Mas ainda senti falta de algumas funcionalidades que estão no YouTube, por exemplo, como a pré-visualização de cena ao posicionar o cursor em cima da barra de reprodução, ou mesmo a indicação de qual é o tempo daquele ponto específico. Ou mesmo de marcações do episódio, como início e termino da abertura e do encerramento, indicação de blocos, e por ai vai. Coisas pequenas, mas que poderiam melhorar muito a experiência do usuário. De qualquer maneira é melhor do que o player antigo… O que também não quer dizer muito.
De qualquer forma, vemos que o serviço que a Crunchyroll oferece atente as necessidades básicas de seu usuário, seja em qualquer plataforma que esse esteja utilizando os seus serviços, principalmente se ele possui uma boa conexão com os seus servidores, mas que ao mesmo tempo há em muito no que melhorar. Em outras palavras, o serviço da Crunchyroll é tão bom quanto, se não melhor, do que sua maior concorrente; a pirataria.
E de modo algum essa frase deve ser interpretada como um bom sinal, ou algo positivo afinal, como o próprio fundador da Valve diria, se você quer acabar com a pirataria você deve oferecer um serviço melhor do que ela. E por mais que me doa dizer isso, em momento algum a Crunchyroll oferece um serviço que seja inquestionavelmente melhor do que a pirataria.
Com isso excluo também o fato de que, sim, nem todo o anime da temporada vai estar no Crunchyroll, muita coisa boa é deixada de fora como os meus dois animes preferidos do ano de 2017, Made in Abyss e Sakura Quest. Afinal, é um serviço licenciado, e dado a quantidade de produções que temos a cada três meses seria loucura esperar que uma só plataforma conseguisse adquirir o direito de todas essas produções.
Mas, dito isso, a Crunchyroll é de longe a plataforma que possui a maior quantidade de animes licenciados por temporada, ao ponto de que raramente me interesso por mais do que oito títulos que não estão disponíveis no serviço. Oque pode até parecer bastante, mas considerando que eu realmente assisto de tudo, e que é bastante normal para mim acompanhar mais de vinte títulos por temporada, esse número deixa de ser tão impressionante.
De qualquer forma, a Crunchyroll sabe o quão importante é manter o seu catálogo atualizado, e o quão esse número de produções presentes no serviço é o seu grande diferencial (comparando com as legalizadas, obviamente), e é por esse exato motivo que ela investe tanto na produção de vários animes. Não é raro ver anúncios, cartazes, e outros materiais promocionais com o logo da Crunchyroll estampado neles. Afinal, a partir do momento em que a empresa torna-se coprodutora desses títulos torna-se muito mais fácil disponibilizá-los para todos os seus usuários, seja qual quer a região em que estejam.
Obviamente, algumas coisas que ela investe são muito boas, como Yuru Camp e Sora yori mo Tooi Basho, outras acabam se tornando verdadeiras surpresas no meio do caminho, como Kemono Friends e Last Period, mas há também aqueles títulos que realmente são dispensáveis, ou cuja qualidade é tão duvidosa que chego a me questionar se a Crunchyroll não só pagou um lanche para os funcionários do estúdio e se deu por satisfeita.
Mas é exatamente por esse motivo que não fico sequer surpreso pelo anúncio de sua primeira série original, High Guardian Spice, que acabou causando uma grande revolta logo em seu primeiro trailer de anuncio por, bom, diversos motivos.
A primeira coisa apontada por quem reclamou desse trailer de anuncio foi o quão forte ele bate na tecla da diversidade e inclusão, mas, sinceramente, se você se incomoda com esse tipo de coisa deveria revisitar aquilo que está assistindo, porque… de forma alguma diversidade afeta de forma negativa uma obra, pelo contrário, obras que possuem personagens muito parecidos entre si são geralmente tediosas e pouco inspiradoras e geralmente as séries mais populares são aquelas que possuem um elenco bastante variado e colorido.
Duvida de mim? Ok. Você gosta de Boku no Hero Academia? Então, muito provavelmente o seu personagem preferido não é o mesmo que o meu, nem o de um outro amigo seu, ou de uma garota que também gosta da série. Ter personagens que se difiram entre si, seja em etnia, origem sócio-econômica, personalidade, gênero ou estilo, possibilita que diversas pessoas consigam se conectar com aquele elenco e se envolver afetivamente com a série, o que é um dos primeiros passos para alguém gostar de algo.
Ao mesmo tempo vários animes tratam da diversidade e individualidade das personagens da sua própria maneira. Oshiete! Galko-chan, é um exemplo de como a diversidade pode ser uma força na obra, ou mesmo seu assunto principal, mostrando ao telespectador que até mesmo a pessoa com que ele menos vai com a cara na primeira vista pode ser alguém com quem ele é capaz de se conectar, ou compartilhar algo em comum.
Demi-chan wa Kataritai por outro lado se disfarça de um anime de garotas monstro para mostrar que, no fundo, nossas deficiências e carências nos separam tanto quanto nossas características físicas e psicológicas.
Ou ainda, posso citar Shingeki no Kyojin que, apesar de não ter igualdade de gênero como um tema estampado em sua narrativa, o autor já demonstrou ter bastante preocupação com o assunto, e é algo que afeta a obra diretamente, não apenas no design dos uniformes que os personagens usam mas no próprio peso de personagens masculinos e femininos possuem na trama.
Enfim, eu poderia continuar citando vários outros títulos que possuem diversidade como elemento, em qualquer nível que seja, mas creio que o meu ponto já está dado:
O problema não é a diversidade, mas sim o modo como ela é posta ao telespectador. Diversidade não é algo novo, está em várias obras, no nosso dia a dia, principalmente aqui no Brasil, e tratá-la como uma preocupação exclusivamente sua não apenas é arrogante como algo falso e injusto para outros autores. E mais, o próprio fato de tratar a diversidade dessa forma é tratar pessoas negras, trans, portadoras de deficiências ou mesmo mulheres como anormalidades, quando na verdade pertencer a qualquer um desses grupos é tão normal quanto não pertencer a eles.
Inclusive, esse é o maior problema daquele trailer. Não é o fato dele ser mais um anime genérico americano, dele pautar a diversidade ou dele pouco mostrar do que trata o desenho, mas sim do trailer coloca como especial algo que já está sendo feito ao menos meia década, e deles falarem como se fossem os únicos a fazer animação do modo tradicional, quando a maioria esmagadora animes é feita desse modo.
Mas High Guardian Spice não é o real problema aqui, ele é apenas um sintoma daquilo que realmente fere o Crunchyroll de dentro pra fora. O real problema é a falta de prioridade com o que realmente importa, com aquilo que o seu público alvo realmente quer: Um melhor serviço, o que inclui o player novo, melhor estrutura dos servidores, melhor conexão a eles, um site mais moderno e usual. Além de, é claro, continuar licenciando animes, investido na produção deles e permitir que séries que só são populares aqui no ocidente ganhem continuação.
Com isso podemos observar que a grande maioria dos problemas que a Crunchyroll tem são fruto da sua central americana, afinal, é ela a responsável pelo site, pelo player, em quais plataformas o serviço está disponível, como o dinheiro que ela arrecada será distribuído, quais animes ela irá contribuir financeiramente com a produção e quais projetos ela produzirá por conta própria.
Dito isso, a vertente do Brasil também é responsável por alguns dos problemas da plataforma, como a má conectividade com os servidores, mas obviamente mesmo esse quesito a culpa não pode ser jogada inteiramente em cima do colo dela, já que a má conectividade também é por culpa da nossa infraestrutura de internet, das provedoras controlando o fluxo de dados e dando prioridade a certos sites e restringindo a velocidade de outros, ou até mesmo por falta de manutenção.
Por outro lado, eu não posso terminar esse texto sem elogiar o papel que a Crunchyroll tem em resgatar a cultura de dublagem de animes no Brasil. Não apenas dublando alguns de seus títulos mais populares, como Free, Re:Zero e Black Clover, como trazendo-os para a Tv aberta, permitindo que mais pessoas tenham acesso a esse tipo de conteúdo, independente de terem boa conexão de internet, disposição e vontade para encarar um episódio legendado, ou mesmos recursos financeiros para assinar o serviço e possuir alguma das plataformas em que ele está disponível.
E com isso gostaria de finalizar com o porquê, apesar de enxergar tantos problemas na plataforma, e em algumas decisões da empresa, ainda utilizar o Crunchyroll como meio principal de assistir animes.
Primeiro porque considero o modo mais prático de acompanhar, todos os dias, os episódios recém lançados através da funcionalidade do “minha lista” que o serviço oferece. É pratico abrir durante o dia, ver o que já está disponível e assistir logo em seguida. Tanto é que a cada temporada deixo o que não foi licenciado pelo Crunchyroll para o final dela, mesmo que esteja em outro serviço que eu tenho acesso diariamente (leia-se Netflix).
Segundo, justamente por ser um serviço licenciado eu ao menos sei que sempre terei ajuda do suporte técnico para resolver qualquer problema, ou dúvida, que eu possa ter, e, ao mesmo tempo, tenho a certeza que o site vai estar lá no dia seguinte, e que não será derrubado por questões de direito autorais, como volta e meia acontece com sites não licenciados. E também, por se tratar de um serviço oferecido por uma empresa que quer manter os seus clientes, sei que em momento algum eles usaram meu dispositivo como minerador de criptomoeda, ou qualquer coisa do gênero, sem a minha expressa autorização.
E terceiro, eu provavelmente não estaria assistindo animes com tanta frequência se não fosse pelo fato de assinar o Crunchyroll. Não só pela praticidade, ou pela pressão mental de estar pagando por isso, mas porque antes de assinar o serviço eu estava há um bom tempo sem assistir nada, não tinha motivação para continuar baixar episódios diariamente, e nem paciência para ver títulos serem abandonados pelas fansubs. Mas quando o Crunchyroll ficou disponível para o Wii U (sim, o Wii U) decidi dar uma chance para plataforma, já que ofereciam um período relativamente longo de testes. E, desde então, deu no que deu, nunca mais parei de usar o serviço.